terça-feira, 7 de junho de 2011

O ar que respiramos é limpo? Quem sabe dizer?

Por Germano Leite

 Dados de 2009 da estação próximo à Ponte dos Franceses (BR-392)

         Três décadas após a instalação de equipamentos de monitoramento do ar, Rio Grande pode ter hoje menos controle do que na década de 80

         Na semana em que se comemora o Dia Mundial do Meio Ambiente, uma constatação: uma combinação de bons resultados na economia pode estar gerando, em contrapartida, uma apatia geral em relação ao meio ambiente, quer seja por pressões sofridas pelos rotulados como “ecochatos”, como também pela percepção de que, como a economia vai bem, mais vale, por exemplo, comprar um carro zero do que se queixar de que, a cada dia, as cidades estão mais poluídas. Localmente, esta situação se traduz no fato de que, apesar de há anos a cidade ter deficiências no monitoramento do ar, não se ouvem críticas mais contundentes, seja por parte da população, dos órgãos ambientais ou mesmo da imprensa.

         Rio Grande é emblemática do problema. Aqui, o desenvolvimento chegou com força, em função de uma série de fatos positivos, como a melhora geral na economia do país e os investimentos do governo federal no polo naval, gerando milhares de novos empregos e aumentando a massa salarial no município. O orçamento municipal, por exemplo, engordou dos R$ 162 milhões em 2006 para R$ 303 milhões (previsão para 2011). Em curto período de tempo, diversas novas fábricas pipocaram no Distrito Industrial, enquanto outras intensificaram suas atividades. O problema é que, apesar desse aumento da movimentação na indústria local, o monitoramento do ar que o rio-grandino respira não só não acompanhou o desenvolvimento como reduziu-se drasticamente.

           Segundo informações da própria Fepam (Fundação Estadual do Meio Ambiente, órgão responsável pelo monitoramento da qualidade do ar), a maior parte das estações fixas de monitoramento existentes em Rio Grande estão hoje desativadas. Das seis estações implantadas há 30 anos atrás (na Vila Hidráulica, junto à Corsan; no centro, na Praça Montevidéu; na rua Eng. Alfredo Huck, junto à Estação 2 da CEEE; no quartel da Brigada Militar; no campus da Furg e junto às antenas da Rádio Cassino, próximo à Ponte dos Franceses), apenas a da Corsan tem dados de monitoramento exibidos no site da Fepam.

           A estação mais próxima da zona industrial, que teoricamente deveria ser a mais monitorada, não apresenta dados desde setembro de 2009, ainda sob o governo de Yeda Crusius (PSDB). E chama a atenção o fato de que a divulgação dos dados foi interrompida justamente após um período de decréscimo da qualidade do ar (ver infográfico). De janeiro a maio daquele ano, as leituras apontam para qualidade do ar “boa”. Em junho e julho, acendeu a luz amarela, com qualidade apontada como “regular”. Em agosto, nova piora, com indicador de “má” qualidade e altos índices de dióxido de enxofre. E, em setembro, a leitura de Partículas Totais em Suspensão (PTS), que registrava índices cada vez maiores, chega à maior do ano, com qualidade do ar “regular”. A partir daí, a Fepam para de divulgar novos números.

           Já as estações móveis, utilizadas ocasionalmente para medir outros poluentes, como partículas inaláveis, dióxido de nitrogênio e fluoretos totais (estes, liberados no processamento de fertilizantes fosfatados), estariam desde 2004 sem aferir dados em Rio Grande, segundo pesquisa feita em 2006 pela geógrafa e mestre em Educação Ambiental pela Furg Michelle Rodrigues Nobrega. Naquela época, em seu trabalho “Educação Ambiental, cidadania e qualidade do ar em Rio Grande”, a pesquisadora já apontava as mesmas dificuldades que nossa reportagem foi encontrar ainda hoje: a gerência regional não dispõe de dados, e mesmo o órgão central ou não os tem ou é extremamente burocrático para informá-los.

“Sensações” de poluição

          Com a inatividade dos equipamentos de medição e monitoramento, não há como a população saber se o ar que respira é ou não adequado. Também os parâmetros para a liberação de novas indústrias ficam fragilizados. No início deste ano, os governos estadual e municipal comemoraram a intenção de mais uma empresa de fertilizantes de instalar uma unidade no Distrito Industrial de Rio Grande. Segundo noticiário, a empresa pretende instalar uma unidade com capacidade de produzir 100 mil toneladas/ano de fertilizantes, para a qual a Fepam inclusive já liberou a licença prévia. Segundo a própria empresa, o potencial da unidade é de geração de apenas 50 empregos diretos.

             Sem informações oficiais sobre a qualidade do ar, o rio-grandino se vale de medidas “pessoais”, como a visão, o olfato e mesmo o “paladar”. Empiricamente, a população “sente” a poluição do ar quando vê grossas colunas de fumaça saindo das fábricas, quando sente o cheiro forte de amônia no ar ou mesmo quando os poluentes causam irritação na garganta. E, como não há confirmação científica sobre os índices de qualidade do ar, todos perdem, inclusive as empresas, já que não podem sequer comprovar que o ar não estaria “tão ruim assim”.

           Um exemplo de medição “empírica” é a feita por um funcionário de uma empresa do polo naval. Fabio, 28 anos, que prefere não se identificar, diz que, nos dias em que o ar está “mais carregado”, sente uma forte irritação na garganta e nos olhos. Alega que também já apresentou problemas na pele. “Até os veículos sofrem”, diz, apontando o banco de sua moto, esbranquiçado por uma fuligem que se deposita dia após dia. A mesma percepção é apontada pela diarista Rose Pereira, 37 anos, moradora da Vila Santa Tereza, que diz sofrer principalmente em dias de vento Sul e temperaturas mais altas. Ela acrescenta que a situação continua a mesma a cada novo governo, mesmo após as típicas promessas pré-eleitorais de que o problema “vai ser solucionado”.

Novos governos, velhos problemas

            Em junho de 2008, na oposição, os deputados de esquerda na Assembleia criam um grupo de trabalho dentro da Comissão de Serviços Públicos da Casa para investigar o que chamavam de “desmantelamento dos órgãos estatais”. Dentro destes, figurava a Fepam. Representantes de entidades ligadas à área ambiental no Estado denunciavam que o governo Yeda privilegiava “os interesses de grandes empresas em detrimento da proteção do meio ambiente e da qualidade de vida”. A comissão era presidida pela deputada Stela Farias (PT), hoje secretária da Administração no governo Tarso Genro.

          Dois anos depois e atualmente comandando o governo do Estado, o PT continua à frente da Comissão de Serviços Públicos, presidida agora pelo petista Luis Fernando Schmidt. Quanto à investigação sobre o desmantelamento do órgão ambiental, nenhuma informação. A assessoria do deputado diz que ele não tinha mandato naquela época e por isso não havia como se manifestar, mas que iria buscar se informar sobre o problema. Até o fechamento da matéria, não chegaram as informações. A reportagem também procurou a deputada Stela Farias, hoje ocupando cargo no Executivo, mas esta também não se manifestou.

          A Fepam foi procurada durante toda a semana, mas também não prestou informações até o fechamento da matéria. Em contato com a diretoria técnica, em Porto Alegre, a resposta foi de que o diretor, Flávio Wiegand, não falaria à imprensa. Já a assessoria alegou que “os técnicos estavam em vistoria, o que dificulta obter informações”. Por sua vez a Regional de Pelotas, que de lá controla também Rio Grande, disse que não detém os dados relativos a monitoramento do ar no município, estando estes centralizados na capital.
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