sexta-feira, 29 de julho de 2011

A universidade e o complexo celulose-papel
Professora, Dra. Rosemeire A Almeida
Coordenadora I Simpósio sobre a Formação do Complexo Celulose-Papel em Mato Grosso do Sul: Limites e Perspectivas
Adital
          No período de 30 de junho a 2 de julho de 2011, no auditório da UFMS/Campus de Três Lagoas/MS, estiveram reunidos professores, estudantes, autoridades públicas, agentes sociais e de pastoral e demais trabalhadores e trabalhadoras da cidade e do campo para a realização do "I SIMPÓSIO SOBRE A FORMAÇÃO DO COMPLEXO CELULOSE-PAPEL EM MATO GROSSO DO SUL: LIMITES E PERSPECTIVAS”. O referido Evento se constitui de uma iniciativa da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/UFMS, Universidade Federal da Grande Dourados/UFGD e Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul/UEMS, e contou com apoio financeiro da FUNDECT/MS.
         O objetivo primordial foi a abertura, dentro da Universidade, de um espaço público de debate acerca da formação do complexo celulose-papel, dentro da premissa da indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão. E, mais, da necessidade da Universidade pública cumprir sua função social, que implica o compromisso com a sociedade, entendendo que a melhor forma de cumpri-lo é exercer o questionamento com amplos setores e sujeitos nela inseridos.
        Reforçamos, deste modo, a linha política do evento que é a mesma da Universidade pública, gratuita e de qualidade, qual seja servir ao interesse público, diagnosticando demandas na sociedade e buscando alternativas. O formato deste primeiro Simpósio traduziu essa preocupação ao dar espaço para as instituições públicas e organizações sociais e religiosas exporem suas ideias a fim de que as demandas da formação do complexo celulose-papel cheguem à Universidade para orientar temas de pesquisa.
Parte significativa do debate foi marcada pela interação com estudiosos dos impactos do complexo celulose-papel que aceitaram dividir suas experiências. Deste modo, foram apresentados resultados de pesquisas realizadas nos estados do Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Bahia e São Paulo. Para estes estudiosos, as transformações que se realizam no ambiente são muito preocupantes devido à redução da biodiversidade, bem como a contaminação dos recursos hídricos, somando-se ainda ao impacto sobre o modo de vida dos pobres da terra, principalmente das comunidades tradicionais e bairros rurais que vêem seu mundo sendo desagregado pelo peso do complexo celulose-papel. Isto se deve a diversos fatores como o plantio de árvores de uma única espécie exótica ocupando áreas que deveriam ser preservadas, como topos de morros e margens de rios e nascentes, também ao uso intensivo de herbicidas, inseticidas e adubos químicos provocando a contaminação de nascentes e envenenando animais e peixes, em claro desrespeito à legislação ambiental –- como demonstrado pelo palestrante da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
        Todavia, evidenciou-se também a necessidade de acesso a informações in loco para que pesquisas possam ser realizadas a fim de diagnosticar impactos, uma vez que o bioma cerrado é diferente dos biomas do Rio Grande do Sul, São Paulo, Espírito Santo e Bahia, onde já existem pesquisas em áreas de eucaliptais, mas cujos resultados não podem ser transportadas para a região sul-mato-grossense. Um dos aspectos importantes a ser considerado nas pesquisas em Mato Grosso do Sul, sobre o comportamento do eucalipto, diz respeito à existência de um clima com duas estações bem distintas: período de chuva e o período de escassez hídrica.
        Mesmo com carência de pesquisas de base, já temos dados preocupantes em relação ao estado de Mato Grosso do Sul, tais como: agravamento da concentração fundiária, redução da produção de alimentos, desagregação de comunidades no entorno a área de expansão do complexo e indícios de impactos sobre as nascentes nas áreas de plantio de eucalipto da década de 1980.
        Outra parte dos debates foi marcada por preocupações voltadas para o questionamento do modelo econômico exógeno implantando na região. O crescente investimento do Estado e dos setores da economia local no ciclo do eucalipto –como sendo a solução econômica da região Leste do MS–, pode tornar esta área vulnerável a crises, uma vez que esta opção como caminho único deixa pouco espaço para projetos alternativos que possam funcionar como amortecedores, principalmente para aqueles mais vulneráveis socialmente, num cenário de retração capitalista global que afete o mercado de celulose. Dito de outra maneira, a repetição deste modelo econômico altamente dependente do mercado externo e alicerçado na celulose, uma mercadoria voltada de forma majoritária para fins de consumo não essenciais à reprodução da vida e para a exportação, pode representar o comprometimento de amplos setores da economia envolvidos em arrendamentos, comércio, empregos.
        Conclui-se que a expansão capitalista do complexo celulose-papel no cerrado sul-mato-grossense, sob auspícios do Estado, gera controvérsias tanto em termos sociais como ambientais, uma vez que impactos já aparecem na leitura dos povos que vivem nestas áreas, apesar do monocultivo de árvores representar pouco mais de 1% da área total do MS. Percepção do senso comum que deve ser considerada como indicador da necessária posição de alerta, tanto do Estado como dos pesquisadores, no sentido de aprofundar a fiscalização e o estudo destas áreas, principalmente porque esses impactos já foram registrados em outros Estados que viveram o ciclo do eucalipto.
        Enfim, mesmo considerando as diferenças existentes em relação aos cuidados ambientais desde as décadas de 80-90 até hoje, reiteramos que o Simpósio alertou para a necessidade de um esforço conjunto das empresas, das esferas locais e regionais do poder público, de pesquisadores e da sociedade em geral no sentido de garantir as condições para a manutenção dos valiosos recursos do Cerrado para as atuais e futuras gerações de forma que os fins econômicos não sejam justificadores dos meios empregados em nome do desenvolvimento.
[Fonte: CPT/MS]
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