OS
VERDADEIROS VILÕES DA PRAIA
Por
Swami Fonseca
Nós
iremos pisotear bem a areia deixando a nossa pegada. Andaremos aos bandos
reunidos em famílias. Faremos muito barulho e o que sobrar deixaremos ali mesmo
para o mar levar. Vamos impregnar toda orla com a nossa presença competindo por
cada centímetro na areia. Mas não nascemos na praia e ela é somente de passagem
porque o que queremos é um território ao Sol. Nosso som alto avisa o clã que pertencemos
e poderá incomodar os desavisados, mas mesmo assim não sairemos dali, porque a
praia é somente nossa. Somos os vilões da praia porque ameaçamos o descanso, o
silêncio e ignoramos a melodia das suas ondas. O registro do que somos e do que
comemos fazemos questão de deixar para todos verem. Somos bárbaros porque tudo
que está a nossa volta é nosso e de mais ninguém. Mas ainda podemos ser muito
piores quando abandonamos nosso melhor amigo ali mesmo na praia debaixo do Sol
escaldante sem ter para onde ir e em meio a milhares de carros. Justamente
porque não queremos mais compromisso de cuidar de alguém que não seja nós
mesmos. Só queremos usufruir ao máximo a vida e o nosso próximo é o nosso “eu”.
Nosso Deus virou dinheiro e edificamos a Sociedade do Descarte num império
materialista. Somos capazes de valorizar mais uma lata de cerveja do que aquele
amigo de quatro patas deixado para trás. Mentimos para nós mesmos que aquele
cão abandonado ficará bem e instantes depois já esquecemos que ele sequer
existiu. E enquanto isso assistimos televisão para nos entreter e ouvir que os
vilões do verão são os cães abandonados por nós dias atrás. A mídia inventa os
culpados e simula o júri popular e as vítimas – os cães – não têm direito a
defesa. Enquanto isso os verdadeiros vilões acomodados aguardam o próximo
noticiário afoitos por trágicas notícias. Mas a lista de criminalizações não
pára: são micoses, mordidas e tudo que for manipulável para estigmatizar quem
não pode se defender. Esperar o quê se fizeram o mesmo com os da própria
espécie durante a escravidão, onde os negros eram acusados de transmitir doenças.
Eles nem ao menos sabiam da acusação porque não compreendiam o português,
apenas reconheciam as ações e os olhares de repulsa.
Grande vilão humano que não foi para
o tribunal por crime de abandono e de tornar insalubre a praia de todos com seu
lixo. Não, ao contrário se perigar ele reza para dar uma de bom moçinho
enquanto o seu ex animalzinho de estimação é mau tratado, atropelado ou morto
de fome e sede na praia disputada por centenas de vilões humanos. Só que nesse
enredo de criminalização da vítima é ocultado a grande fonte de poluição das
praias, que são as ligações clandestinas de esgoto na rede pluvial feita pela
própria população. Isso acontece em todo o litoral brasileiro e uma das maiores
fontes de contaminação por coliformes fecais causando diarréias e várias
doenças parasitárias. Infelizmente aquele cãozinho abandonado virou o bode
expiatório de todos os verões fruto da insensibilidade humana e reproduzida
pela mídia tendenciosa e instituições que deveriam apontar a verdadeira fonte
de contaminação. Mas ao contrário
preferem as amenidades fúteis do que enfrentar e resolver o problema que a
décadas se reproduz com o aumento da população humana.
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